Perguntas Assertivas
Para entender o usuário, é necessário constantemente observar e compreender suas necessidades e desejos.
Uma das principais formas de fazer isso, até por ser acessível, rápida e barata, é por meio de entrevistas (às vezes, até de conversas mais informais) com pessoas.
Para poder extrair informações valiosas desses momentos (entrevistas/conversas), é necessário saber conduzir a argumentação do usuário para alguns objetivos.
Conversas vagas, além de não somarem nada ao que se quer, podem resultar em dispêndio de tempo e outros recursos.
Para conduzir os usuários em suas argumentações, verbalizações de pensamentos e narrativas, vamos ver como aplicar perguntas de forma eficiente e efetiva.
Recomendações
Os tópicos a seguir sintetizam as principais recomendações para fazer perguntas em entrevistas/conversas com usuários.
1. Deixar o usuário à vontade
A primeira dica, fundamental, é deixar o usuário à vontade para falar sobre suas experiências.
Cabe esclarecer a ele que em nenhuma hipótese está se testando seus conhecimentos ou habilidades e, sim, procurando-se entender sua experiência.
Para criar esse “clima”, vale iniciar a entrevista de uma maneira informal, com algumas perguntas “quebra gelo”, levando o usuário para dentro do motivo da conversa de modo suave e fluído.
O objetivo é que ele se abra para falar sobre vivências, problemas, “dores”, necessidades, desejos — onde residem oportunidades para produtos/serviços inovadores.
2. Aplicar perguntas de forma aberta
O esperado é que o usuário fale em uma entrevista. Quanto mais falar, e mais se atenha ao tema, mais chances de se ter subsídios sobre suas “dores” e as oportunidades decorrentes.
Algo que ajuda é fazer perguntas abertas, que permitam ao usuário descrever situações, pensamentos, vivências, problemas etc.
Por exemplo, pensando-se em uma edtech (startup de educação), em vez de perguntar qual foi a última vez que o usuário fez um curso online, pode-se pedir para ele contar como foi a experiência mais recente ou a mais marcante em um curso online ou por que nunca realizou um antes.
3. Ajudar a relembrar o passado
Praticamente, todas as descrições de experiências de um usuário demandarão que ele recupere memórias, ou seja, olhe para o passado, seja recente ou distante.
Ajudá-lo a reavivar memórias, a relembrá-las em detalhes e com precisão, é algo que contribui para relatos mais ricos dos problemas que ele enfrenta e das soluções que usa ao longo da vida.
Pode-se contribuir perguntando onde ou em que circunstâncias estava na ocasião em que vivenciou uma “dor” ou a satisfação dela.
Pode-se, também, incentivá-lo a interpretar (o que pensou, o que lhe passou pela cabeça) quando se deparou com determinado problema/incômodo, por exemplo.
Em outras palavras, deve-se evitar que o usuário fale “em tese” (por meio de abstrações, que não dizem respeito a suas vivências pessoais) ou de forma hipotética (sugerindo algo que “poderia” acontecer em um futuro incerto, por exemplo).
O que interessa são vivências e experiências reais, que demonstrem seus hábitos e comportamentos.
4. Evitar influenciar respostas
As perguntas devem ser aplicadas de forma “neutra”. Isto é, não devem levar o usuário a simplesmente confirmar ou negar algo ou induzi-lo a respostas condicionadas.
Em vez de perguntar quão irritado o usuário ficou ao se deparar com um problema, por exemplo (o que pode levar a relatar uma irritação que, talvez, nem tenha vivenciado), pode-se perguntar quando ele não completou uma determinada tarefa e o que sentiu ao vivenciar aquilo.
Isso abre possibilidades para ele ser mais sincero sobre o que de fato sentiu, que pode não ser uma irritação, mas, talvez, apenas a necessidade de procurar outra forma de resolver o problema.
5. Considerar os silêncios
É importante dar espaço e compreender eventuais silêncios do usuário. Se necessário, pode-se deixá-lo mais à vontade para que pense a respeito, não responda algo ou dê um tempo antes de uma nova pergunta.
Silêncios ajudam na organização dos pensamentos e podem, é claro, ser reveladores sobre determinados problemas, vivências, “dores” etc.
6. Evitar entrar em embates
Pode ocorrer de algum usuário questionar o entrevistador de volta, perguntar se ele concorda ou discorda de algo ou pedir consentimento sobre se está certo ou não.
O entrevistador deve evitar entrar nesses diálogos e expressar suas opiniões, o que pode enviesar a abordagem.
O melhor é tentar devolver a pergunta do usuário com outra pergunta, de maneira que ajude ele a elaborar porque pensa daquela forma, porque quer o consentimento ou a opinião da outra pessoa.
7. Perguntar de novo e evitar suposições
Na dúvida, vale repetir uma pergunta ou refazê-la de outra maneira, imediatamente ou em outro momento da entrevista.
O que não cabe é o entrevistador ficar com lacunas acerca das opiniões do usuário ou, pior, tentar preenchê-las com suposições, com aquilo que “acha” que a pessoa quis dizer.
Às vezes, repetir determinadas perguntas de outra forma, também, podem revelar contradições na fala do usuário e ajudar a ter uma percepção mais precisa de seus hábitos.
8. Ouvir e prestar atenção no usuário
Entrevistá-lo como quem conversa de forma amigável e cordial com ele, olhando nos olhos, mas sem um ar de inquérito ou interrogatório.
Evitar desviar os olhos a pontos do ambiente ou, durante os relatos do usuário, deixar de prestar atenção a ele.
Isso pode fazê-lo perder a motivação no relato ou achar que não está correspondendo ao que se espera dele.
9. Falar sobre experiências, não sobre soluções (muito menos vender o produto)
Entrevistas devem ser sobre experiências do usuário, suas vivências e impressões. Elas não devem tratar de avaliações ou concordâncias com soluções, nem pedir ideias de soluções (em termos de produto) aos usuários.
Outro princípio básico é evitar vender o próprio produto ao usuário, compará-lo com concorrentes ou fazer perguntas que inclinem o usuário a dizer que gosta do produto, por exemplo.
São práticas abomináveis, que apenas tomam tempo do time e do usuário e não somam percepções sobre problemas e oportunidades.
Conclusão
Entrevistas com usuários são momentos que permitem entrar no universo subjetivo de outros seres humanos, o que pode revelar desejos e necessidades capazes de originar novos produtos/serviços ou reinventar produtos/serviços existentes.
Uma boa condução de entrevistas é uma das formas por excelência de se explorar esta dimensão, que outros métodos, como os quantitativos, não conseguem abordar. Pode-se dizer que há um misto de “arte” e “ciência” no ato de entrevistar pessoas.